Caminhos Tortuosos no Descampado sem Curvas Caminhos Tortuosos no Descampado sem Curvas
Sem poder me virar, seguir em frente, ou chegar a uma conclusão, eu me sento e escrevo, sem saber muito bem o quê.

mais um adjetivo para volúvel -> The current mood of acredoce at www.imood.com

 

10.07.2023

Desde o início eu sabia que o esforço viria mais do meu lado. Mas era a primeira vez que eu sentia o amor transbordando. Por vezes ele tentou até me avisar, mas segui determinada a conquistar. 

E consegui pouco a pouco ultrapassar as barreiras. Fui vendo coisas ruins, mas na certeza de que eu conseguiria mudar. O amor faz milagres. A casa mal cuidada, a dificuldade de me reconhecer como mais que uma foda. 

Foram uns três anos até ele me chamar para morar com ele. Jackpot. Amor recíproco, que delícia. E foram anos bons. Ríamos e raramente havia briga. Eu ganhava uma grana que me permitia ser feliz e me sustentar. Pagava a internet, comprava comida, cuidava da casa. Maravilha.

Mas aos poucos as coisas foram acontecendo. Eu não sei precisar quando, mas lembro de começar a pescar mentiras, informações que não batiam. Lembro inclusive de um golpe que ele deu e eu tentei resolver. Lembro da atitude: achar desculpas para justificar a falha. 

Sabia que não era ok, mas tentei resolver. E hoje consigo perceber esse como o momento em que me dei conta que ele não era o que eu imaginava. Lembro que ele até me ouvia, tentava fazer certo, mas era sempre arrastado para os velhos hábitos.

Foi o primeiro de muitos problemas desse tipo. E pouco a pouco foi minando a confiança. Mas o pior ainda estava por vir. Ele tinha um filho de um relacionamento anterior. Eu detesto crianças, mas tentei com o coração aberto. Devia ter percebido, mas quando vi era tarde demais.

Fui vendo como as coisas começaram a azedar: o menino tinha conversas com os familiares que incluíam sempre falar muito mal de alguém. Eu até uma vez chamei a atenção dele, falando que não era legal ficar falando mal dos outros, ah, como eu sou inocente...

Um dia a mãe do menino veio me confrontar exigindo um comportamento X meu. Eu mostrei que eu fazia o melhor que podia e a mãe ficou meio sem argumentos. Eu estudava com o menino quase todos os dias, suas notas ótimas. Eu sentia honestamente que estava fazendo o meu melhor.

Eu sou neurodivergente. Eu recebo uma informação, uma ordem, um passo a passo e sigo à risca. Com menino, embora tenha marcado com a mãe uma conversa por telefone (ela morava looonge), ela nunca apareceu. 

Eu organizei um quarto pra ele. Eu saí de casa em pleno Natal para buscá-lo em outro estado com meu cônjuge. E agora, olhando pra trás, percebo que nunca recebi um pingo de gratidão pelos meus gestos. 

O menino estava com pré diabetes, açúcar no alto. Precisava controlar a dieta. Briefing claro. Missão dada é missão cumprida. Conversei com minha mãe para saber como me comportar com ele, tracei planos e metas.

Como eu sou inocente.

Percebia que era estranho, que a família criava um bloqueio em volta do menino. Sabe aquela história de: o mundo é mau com ele. 

Ele não tinha amigos, quase nunca o via com alguém. Ia esporadicamente na casa de um, mas invariavelmente esse amiguinho sumia. 

A família dele me odiava abertamente. Depois percebi que os vizinhos também. Passei a ouvir coisas que, na época, não faziam o mínimo sentido: ele é tão bonzinho, seja boa com ele. 

E eu achava que isso era normal.

Mas daí vi o comportamento mudar. Afinal, ninguém consegue manter uma fachada por muito tempo. Pequenas mentiras. Minha cachorra passou a ter medo dele. Atitudes esquisitas. E uma das coisas mais bizarras: comecei a ver "o olhar". Numa fração de segundo, o olhar dele era fixo, cheio de ódio, algo de dar medo. E depois ele piscava e sumia.

Foi tudo meio misturado. O pai dele passou a me rechaçar. O filho era dele; como eu podia me meter? Os vizinhos passaram a me olhar feio. O menino ganhava presentes dos vizinhos... Ele passou a fazer malcriação, mas com uma frieza que eu não conhecia. E aquilo me tirava do sério. 

Eu comecei a ter crises de pressão alta. Um dia, fui trabalhar de manhã na feira. Ele ficou em casa. Quando voltei, minha cachorra tinha sumido. Ele olhou pra mim e falou: não sei, só coloquei ela para fora. 

Eu passei uns 20 minutos gritando por ela até que ela voltasse do meio do mato. Estava morta de medo. Ela passou dois dias soltando água pela vagina. 

Os sinais de alerta foram ligados. 

Passei a receber informações: eu não alimentava o menino, eu colocava ele pra trabalhar. Ele chorava para os outros, falando mal de mim e do próprio pai. Os vizinhos passaram a nós considerar pais abusivos. O pai bebe, mas nunca encostou um dedo ou fez nada contra. Eu nunca vi ou ouvi nada. Mas as histórias era repassadas.

Mais um clique no comportamento. A escola mandou avisar que o menino não era bem vindo no passeio de fim de ano da escola. Fiquei sabendo que o comportamento era violento, ruim. Os paus já sabiam. Mas madrasta não é família, né.

Um dia a chave virou pra mim. Estava lavando as roupas do menino. A manta dele, especificamente. Umas manchas marrons. Estranho aquilo. Cremosas. Estranho. Esfreguei. E fui cheirar. Era merda. Cocô. Bosta. Ele havia limpado a bunda suja na manta e colocado a manta pra lavar. 

Tem gente que acha isso normal, mas pra uma criança de 10 anos, eu não. Era um desrespeito. Jogar uma manta suja de merda para eu lavar. Era um: ah, acabou o papel higiênico.

Nenhum remorso, nenhuma culpa. E nenhum pedido de desculpas.

Eu fiz ele lavar na mão. Mais uma crise de pressão alta.

Enquanto isso, eu e o cônjuge montamos uma empresa. A divisão era: eu na administração e comercial, ele no cultivo.

Eu me lembro de passar até 3 horas sentada sozinha limpando cogumelos e fazendo pacotes enquanto ele via tv. Ele não enxergava direito, coitadinho. E eu não pedia ajuda. 

Lembro do desgaste, de ficar que nem uma louca tentando saber a previsão de colheita e ouvir: ih, secou. 

Mas não era para ter cinco quilos? Ah, não dá para ter essa previsão... 

Sempre uma justificativa. E eu tinha que entender. Quantos clientes perdidos, quanta desculpa esfarrapada. Hoje vejo outros cultivos organizados. E o pior: uma parte de mim fica triste porque se sente responsável (deveria ter feito mais).

É aí que percebo como fui me enfiando no fundo do poço, onde estou hoje.

Mentiras, problemas, brigas... Eu levei por anos. Era uma resposta aqui. Um mês depois, a resposta para a mesma questão era totalmente diferente. E vida que segue.

O menino foi embora deixando pra trás um rastro de destruição. E ali eu fui apresentada ao meu companheiro, de fato. Um mentiroso contumaz. 

Queimou dinheiro sem deixar rastro e foi me arrastando pouco a pouco pra lama. E eu deixei. Afinal, como eu poderia admitir que fui burra a esse ponto? E é aí que a gente dá conta de como funciona o relacionamento abusivo: é um enredo que te consome aos poucos.

Eu queria merecer aquele amor, aquele afeto que era cada vez mais escasso. Eu queria ter merecido ser apresentada à família. Queria merecer ser amada como fui um dia. 

A pandemia deixou claro que, quando o sapato apertou pra ele, eu deixei de ser aquela princesa. Eu saí de casa e sustentei ele, literalmente, por meses. Porque ele me culpava por deixar ele sozinho, sem trampo.

Voltei e achei que com a venda do sítio dele seríamos felizes. 

Até fomos por alguns meses. Mas ele simplesmente torrou todo o dinheiro e ficamos sem casa, sem cultivo. Sem nada. Eu descobri que ele mentiu. Enfim.

Tentei terminar, mas fiquei com pena. Ele até caminhou em linha reta por algum tempo. E depois degringolou de vez. 

O filho foi despachado de volta. Sim. Despachado. Fiquei sabendo 48 horas antes. Ele diz que ele também, mas eu honestamente não sei. Não acredito em mais nada. Voltou amargo, parecia uns 5 anos mais velho do que era. 

E o pior: eu o odeio. Soube de muitas de suas histórias, das mentiras que contava para os outros. Ele deixou tudo pra trás quando foi embora, inclusive o vaso sanitário sujo de cocô, com papel sujo de merda jogado no chão e enfiado atrás do vaso sanitário. Calcinha usada. Outros itens que na época mandei fotos pra minha mãe, para saber se era normal. Não, não era.

Bom, íamos pro sítio. Todos nós. Só que era para morar num chalé de 30m2. Não tinha casa. 

Um chalé que só ficou habitável porque eu fiz acontecer. Trabalhei duro enquanto ele estava sempre postergando.

Enfim.

Saí da casa onde eu estava com aluguéis atrasados, sem saber. Ele me enganava abertamente. Dizia uma coisa enquanto a realidade era outra. 

Pagamentos feitos. Ok.

Vamos trabalhar. Estufas caóticas. Sujas. Tudo sujo. Lutei bravamente para colocar as coisas no lugar. E sempre parava no 70% concluído. Nada ficava pronto. Aí o dinheiro acaba, ele não me informa, mente pra geral, deve dinheiro e fode com tudo. 

Mas ficou pior: eu também comecei a me endividar. Hoje estou endividada. E sem previsão de regularizar minha vida. O filho dele virou um ladrão. Roubou até dinheiro meu. 250 reais. Nada acontece, feijoada.

Mexe e remexe minhas coisas. E vi que as do pai também. Mas também fui notando que uma aliança se formava: pai e filho contra mim. Afinal, se temos dois mentirosos aproveitadores, eu sou o elemento a ser detestado.

E assim arrastei meu relacionamento por semanas, meses. 

Eu viajo todas as semanas para sp e volto, faço pedidos, notas fiscais, organizo entregas, vou para feira, eventos... E não tenho nenhum apoio. Ele dá uma migalha e simplesmente não consegue nem fingir mais se importar.

Só que hoje eu tive que dar um basta. Hoje deu pra mim. Estou um caco, me sentindo o último ser humano. Já sei que sou traída, corna e que sou persona non Grata. Sou digna de pena. Sim. Pena. As pessoas passaram a ter pena de mim. 

Estou perdida, sem saber o que fazer. Hoje, enquanto chorava no carro falando com minha mãe e tentando arrumar um lugar pra ir, ele desligou as luzes da casa e foi dormir. Eu já não faço mais parte da sua lista de preocupações. Tanto faz minha presença ou minha ausência.

Eu me dediquei por anos, fielmente. Estou longe de ser modelo de qualquer coisa, mas não merecia isso. O estranho é que essa ausência dele já era sentida por todos. Todo mundo me perguntava: cadê ele? E eu agora percebo que ele realmente já tinha ido embora. 

Preferiu se agarrar às mentiras. À vidinha que parece fácil, mas que vai ruir em pouquíssimo tempo. Mas é isso: ele me largou, mesmo vivendo comigo num chalé de 30m2.

E eu fiquei como eu já imaginava: sem nada. Vazia. Oca. Uma casquinha de mim mesma. 

Dói. Dói muito acreditar que as coisas podiam ter sido diferentes. Que eu podia ter ficado com minha mãe, terminado quando quis. Mas que eu dei essa chance para ser escurraçada do lugar que lutei tanto para construir e constituir como meu lar.

E o pior é que eu sei que ele vai se foder. Que vai se acabar. E eu vou ter que me desligar se quiser me reconstruir.

Mas fica a pergunta: o que que eu faço da minha vida agora?


por acredoce, autora nunca publicada e raramente lida.
preenchimento do cabeçalho obrigatório: 10/07/2023 03:52:00 AM |

 

 


 

 

 

mais tentativas de fazer algum sentido

 

se eu mdaur a oredm das lerats vcoe anida vai me etnedenr?

 

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