mais um adjetivo para volúvel ->
5.26.2004
Gigi
Araruama. Anos 80. Época em que fazia sucesso aquele walkman em forma de fone de ouvido, gigante, pesado, som péssimo, mas que todo-mundo-que-pensava-ser-alguém tinha. Minha irmã mais velha não tirava o trambolho da cabeça, enquanto eu estava mais preocupada em não vomitar no carro. Calor. Engarrafamento. Trailer no Popeye no início da praia de Iguaba tocando 'João Penca e seus Miquinhos Amestrados'. Dias antes do carnaval. Em meio às brigas dentro do carro, enquanto minha mãe pedia pelo-amor-de-deus para que nós parássemos ou "seu pai vai bater de carro", surgia o outdoor imenso:
GIGI - O MELHOR LUGAR PARA SE FAZER XIXI - 30 MINUTOS
Era um dos prazeres de infância. Ver a maquete da Gigi na Gigi. Só lembro da alta qualidade dos detalhes e em como eu sonhava um dia poder fazer uma maquete como aquela para o trabalho do colégio.
Os anos se passaram e hoje em dia todos riem dos anos 80, embora esteja voltando à moda do melhor ao pior da década.
Araruama. Anos 2000. Agora faz sucesso o toca mp3 que ninguém tem dinheiro para comprar, lindo, leve, enquanto no meu carro ainda resiste o toca-fita, já que os últimos dois toca-cd's foram roubados. Minha irmã mais velha lê o catálogo da Folic, Animale, ou alguma outra loja cara, enquanto eu estava mais preocupada em manter o carro nos permitidos 80km/h. Sol com um ventinho frio. Estrada vazia. O trailer do Popeye está fechado e já não se vêem mais no céu os paraquedistas de plástico que eram a febre na praia de Iguaba. Já é quase inverno. Em meio ao silêncio do carro, enquanto minha mãe pedia pelo-amor-de-deus que eu não corresse e meu pai, ao meu lado, mantinha um olho sempre fixo no velocímetro enquanto o outro estudava a estrada, surge um outdoor:
GIGI - CERÂMICA
Vibrei. Minha irmã vibrou. Dei aquele soquinho para o alto, quando meu pai segura o volante:
- Dirigir é com as duas mãos.
- Desculpa, foi a alegria. É raro reencontrar a infância assim. Embora me lembrasse do outdoor como sendo gigantesco.
Minha mãe começa a rir:
- Vai ver que foi você que cresceu. Os tempos são outros. A Gigi perdeu seu posto de melhor xixi. Provavelmente veremos um outdoor do McDonald's assumindo o posto.
Chegamos em Araruama. (Nem é preciso dizer que Pierre está lá e que eu passei pela orla a 35 km/h, só para ser obsessiva) A placa da GIGI estava gasta, um azul desbotado e uma Casa do Pão de Queijo na frente. A GIGI fechou. Continua o lugar,a té mesmo o nome. Uma lojinha de cerâmica vende peças que se encontram na Renner por um preço mais em conta. E a maquete sumiu. Desapareceu. Escafedeu-se. Foi um golpe duro. Passamos uns quarenta minutos, desalentados, passeando pelo lugar. Minha mãe estava próxima das lágrimas. Eu também, confesso.
E nos mandamos para Búzios. Berrei do carro "Je t'aime, Brigitte!" para a estátua de BB na orla Bardot, virando a atração de uns turistas chateados com o mau tempo. Andei pela Rua das Pedras de legging preta e minissaia por cima, com uma blusa stretch preta. Salto annabella. Descabelada com o vento da estrada. Uma punk decadente vinda dos anos 80. Uma homenagem. Um brinde silencioso à minha infância.
Voltamos para casa mais tarde. Fiquei ouvindo Radiohead, Joy Division. Lembrei de tudo o que era tão querido na infância em Iguaba: O posto Tigrão, o condomínio chiquérrimo em cima de um morrinho de frente para a praia, os soldadinhos voadores, a caixa d'água que marcava a rua da casa de meus avós, a Gigi e sua Maquete. No more. Virou Rosebud.
por acredoce, autora nunca publicada e raramente lida.
preenchimento do cabeçalho obrigatório: 5/26/2004 10:12:00 PM
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