mais um adjetivo para volúvel ->
2.17.2004
Teatro - Lugar onde se vai para se ver
Copyright - 2003 - Ryn Gargulinski
Ontem cheguei para fazer as provas, sem conhecer viva alma, tentando fingir que tudo estava sob controle. Minha mãos tremiam, eu sentia as pontas dos dedos geladas, a garganta seca. Sem compreender muito bema razão para o nervosismo extremo, fiz questão de fechar os olhos por dois segundos e pensar no meu 'lugar feliz', onde nada pode me machucar, nada pode me desestruturar.
Tudo bem, eu havia estudado por dias e dias para uma prova com consulta para descobrir, ali, naquele exato momento, que elas não eram permitidas. Todas aquelas fotocópias dentro da minha pasta, olhando para mim, implorando para serem usadas e retiradas de seu estado atual, no qual não tinham importância para ninguém.
O professor deu umas instruções - "escrevam bastante", "? preferível pecar pelo excesso que pela falta" - e eu já pensando na minha pobre tendinite. Mas, é lógico não descansaria enquanto não escrevesso o suficiente para me sentir vazia, todo o conteúdo espremido para as páginas em branco. Mas meu querido ex-possível-futuro-professor deixou a secretária para tomar conta de nós. Uma menina com a qual tenho implicância profunda... Loirinha, magérrima, usando aquelas camisetinhas estilo 'imitação de time de futebol americano', cheia de acessórios de plástico rosa e sapatos de salto altíssimo, quase como aos dos travestis de copacabana. E os óculos douradinhos - o grande detalhe - para dizer que não é burra. Mas eu estava fazendo uma prova séria, não poderia ficar me apegando a isso. Mesmo ouvindo dela, antes do professor sair, naquele murmúrio de boca mole, fazendo cara de coitada: "Ai... eu posso tirar uma cópia para fazer a prova em casa?". Actress Wannabe. Daí por diante minha implicância atingiu níveis perigosamente altos.
Actress Wannabe. Lendo um texto medieval e escrevendo em uma folha de papel ao lado as palavras que não sabia, coisas como excentricidade, ou Profano e Rudimentar. O pior é que a lista era longa... E eu tentando me concentrar na prova.
Eu sou terrível. Vou para o inferno.
E eu sei que ela é o estilo de Pierre. Burra, bobinha, nesse estilinho que tenta parecer descolado, inteligente. A imagem de suas namoradinhas anteriores passava pela minha cabeça. Tive vontade de largar a prova e sair, até porque eu não sei se realmente consigo me manter por mais um ano e meio assim, olhando para a cara dele, que se divide em duas pessoas opostas - quando não há ninguém por perto e quando há -, enquanto eu fico lá, paranóica, olhando apra a secretária e pensando que ele deve estar comendo aquela pobre criatura, sugando toda a vida de mais uma bimbo.
Só sei que terminei a prova. uma hora e meia depois, um tempo bom, mas que só rendeu 7 páginas para duas questões. A segunda então, com apenas quatro páginas, deveria permear toda a história do teatro ocidental. Que feito seria o meu, condensar de maneira eficaz mais de 26 séculos num emaranhado de rabiscos... Tentei, lutei bravamente contra as distrações externas, contra meu conflito interno ligado à paranóia fora-de-controle, tentando fazer com que minha moral e a ética esperada de uma aluna convergissem para um mesmo ponto. Dei boa-noite para todo mundo, com um sorriso simpático, já que estaremos dividindo a mesma sala de aula, e saí daquele lugar, prestando atenção nas vozes nos corredores, tentando saber se Pierre estaria por ali.
Acendi um cigarro, quase toquei fogo na minha franja e olhei para os carros importados passando em alta velocidade. Um outro mundo, aquilo ali. Um outro mundo, onde dinheiro não era problema. Tão pequenos meus conflitos comparados às divergências sociais do país, à minha falta de perspectiva profissional. Pequeníssimos. Dei uma tragada longa no cigarro, para que a fumaça pudesse entrar nos meus pulmões, meu estômago, minha cabeça e levasse embora na fumaça cinzenta minha pequinez. Infelizmente, isso só dá certo nos voice overs de filmes americanos. Eu ainda estou com medo e pensando na secretária com Pierre.
Eu juro que, se soubesse qual daqueles carros estacionados fosse o dele, passava a chave de uma ponta a outra. E daria uma risada mailgna e maléfica, como a louca histérica que sou.
por acredoce, autora nunca publicada e raramente lida.
preenchimento do cabeçalho obrigatório: 2/17/2004 11:14:00 AM
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